Salem Nasser: Os Árabes (no livro contínuo sobre o Oriente Médio)

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A conexão entre os árabes e o o Islã é tão forte que muitos contam a história dos primeiros como se ela tivesse começado com o aparecimento do segundo

Em 8 de setembro de 2023 eu publiquei um post chamado “A Journey into the Middle East” (Uma jornada pelo Oriente Médio).

Eu disse então que ele consistia no primeiro capítulo de uma livro contínuo sobre o Oriente Médio e seus temas, que eu passaria a escrever e publicar aqui assim que atingisse a marca dos 100 assinantes pagos. Esses assinantes teriam acesso exclusivo ao livro como uma recompensa por sua generosidade e confiança.

Ainda não atingi a marca, mas sou muito grato aos assinantes pagos, que não têm recebido muito em troca de suas contribuições, já que a guerra em Gaza me levou a escrever textos abertos a todos, por ser tema de interesse geral.

Resolvi antecipar o início da publicação do livro para os assinantes pagos, mesmo sem ter atingido a meta, por querer muito lhes dizer como sou grato.

Para todos os demais que possam se interessar, volto a abrir o acesso àquele primeiro texto e disponibilizo ainda este segundo.

Recomendo a leitura do artigo do dia 8 de setembro último, ou a sua releitura, para dar sentido a este e os próximos enquanto a continuação de uma mesma história.

Os Árabes

silhouette of people riding camels
Photo by Ryan Cheng on Unsplash

O árabe foi para mim, primeiramente, uma espécie de ser mítico, um condensado de muitas e grandes qualidades: a coragem, a hombridade, a generosidade, a hospitalidade, a honestidade, a fidelidade à palavra dada; um ser orgulhoso, protetor da própria honra e daquela dos seus. Ser árabe era ser tudo isso, e ser um homem inteiro era ser tudo isso. Ser menos do que isso era ser meio homem.

Era um ser tão idealizado que, num belo dia, combinando enfado e exasperação, tive que perguntar a quem me vendia tudo isso: mas onde é que estão esses árabes?!

Estou consciente de que que corresponder aos ideais de perfeição não é feito impossível apenas para os árabes e de que é preciso dizer isso claramente. A maior ou menor distância em relação a esses ideais, para indivíduos e para coletivos, pode depender de muitos fatores e pode variar no tempo e no espaço.

Que os árabes não apresentassem todos eles, todo o tempo, todas essas qualidades, não falsificava o fato de que esses são valores do que se poderia chamar de cultura – civilização talvez? – árabe.

Mas quem são os árabes? Eu já referi aquela flutuação na linguagem que me era dado testemunhar de vez em quando: a referência a nós os árabes, por vezes, e a eles os árabes, por vezes.

Albert Hourani escreveu uma obra de referência a que deu o nome de História dos Povos Árabes, sim, povos, no plural. Assim, ao que parece os árabes podem ser coisas variadas, evidentemente.

Por muitos anos, as evidências dessa variedade me chegavam com pouca força. Eu estava totalmente cercado pela experiência de ser um árabe libanês, levantino e, circunscrevendo ainda mais, procedente de uma determinada região do Líbano e pertencente a uma classe social que emigrou a partir de campos e aldeias onde até ali praticavam a agricultura familiar. O universo árabe da minha convivência era bastante restrito.

Eu tinha pouca familiaridade com o árabe egípcio que não fossem os clássicos da música dos anos 60 e 70 ou um ou outro filme. Tinha menos contato ainda com tudo que fosse árabe do norte da África para além do Egito. Já o árabe da Península Arábica me era conhecido apenas por um ou outro filme ou notícia. A existência de países africanos outros que também eram árabes me era totalmente desconhecida.

De que decorria essa variedade e essa distribuição territorial e o que havia de comum entre esses vários?

Uma coisa que eu vim a aprender, e que é central para entender a história dos árabes, é que muitas dessas populações são hoje árabes porque foram arabizadas quando os territórios em que hoje se encontram foram atingidos pela expansão do Islã.

A conexão entre os árabes e o o Islã é tão forte que muitos contam a história dos primeiros como se ela tivesse começado com o aparecimento do segundo. O próprio Hourani faz isso em seu livro.

Como veremos, há uma história dos Árabes antes do advento do Islã que é tão longa quanto aquela história que, a partir da Revelação, deve ser contada colocando as duas coisas em relação.

Haverá algo central na história dos árabes, algo em torno de que tudo gira, antes e depois do Islã?

Se tal coisa existe, as chances são grandes de que seja a língua árabe…

Nos próximos textos deste livro aberto, os árabes antes do Islã e o papel da língua em sua história…

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