Joseph Massad
(Traduzido e adaptado por Tufy Kairuz)
Pouco depois do ataque lançado pela resistência palestina contra Israel, em 7/11, a máquina de fabricar mentiras israelense começou a operar a pleno vapor. A propaganda sionista, “honrando” sua tradição, publicou acusações de assassinato, enjaulamento e decapitação de crianças, além da violação em massa de mulheres e do massacre deliberado de civis.
A propaganda sionista espalhou-se prontamente no mundo no Ocidente racista que acredita, piamente, na inferioridade palestina e abraçou, há décadas, a tese do supremacismo sionista engendrado por meio de uma vasta rede de narrativas absurdas.
A imprensa ocidental imediatamente aceitou a versão israelense como indiscutível e mesmo quando a propaganda foi sendo desmentida, uma após a outra, tipos como Presidente Joe Biden, continuaram, descaradamente, a disseminar as calúnias racistas em seus pronunciamentos.
Testemunhas oculares israelenses afirmaram ter visto forças sionistas matando civis israelenses e combatentes do Hamas e queimando corpos, para não mencionar o bombardeio indiscriminado de participantes no festival de música, ou o bombardeio de carros em que viajavam civis israelenses em fuga.
Mas todos esses testemunhos não impediram os meios de comunicação e os governos ocidentais de insistirem em calúnias racistas. Todas as “vacinas’ (incluindo a pesquisa acadêmica ocidental, árabe e israelense) disponíveis, desde meados da década de 1950, não conseguiram “curar” os políticos e jornalistas ocidentais contra o racismo sistêmico contra palestinos e outros árabes
A maioria dos árabes, desde o início, rejeitou as afirmações fictícias de Israel. Isto não significa que se estivesse negando que civis israelenses tenham sido mortos durante os ataques. Porém, há uma distância enorme entre a ocorrência de baixas civis durante um choque armado e a intenção de deliberadamente matar civis, incluindo o assassinato de mulheres e crianças.
Mas a razão pela qual a maioria dos árabes não acredita em qualquer coisa vinda dos israelenses é a longa “folha-corrida” de mentiras espalhadas por Israel. Não se trata de preconceito, consciente ou inconsciente, contra os judeus, mas sim, numa avaliação racional, da falta de credibilidade dos sionistas, antes e depois de 1948. Tais mentiras foram desmascaradas por pesquisadores árabes, europeus e também expostas por historiadores israelenses, desde a segunda metade da década de 1980, baseadas em informações obtidas nos arquivos oficiais do Estado de Israel.
A maior mentira israelense é aquela relacionada com a limpeza étnica, que foi levado a cabo por gangues terroristas sionistas na Palestina, entre 30/11/1947 e 14/05/1948. Este ato de puro terrorismo resultou na expulsão de 400.000 palestinos e na decisão dos sionistas de declararem, unilateralmente, a independência do Estado de Israel.
No entanto, entre 14/05 e dezembro de 1948, os sionistas expulsaram mais 350 mil palestinos. Durante esta outra fase da limpeza étnica, foram documentados dezenas de massacres cometidos por gangues sionistas, incluindo, o estupro em massa de mulheres palestinas. Mas ainda hoje, apesar de todas as provas, os sionistas e seus apoiadores, insistem que Israel não expulsou ninguém e que os palestinos deixaram a sua terra natal voluntariamente.
Nas décadas de 1950 e 1960, o governo israelense insistiu em afirmar que foram os líderes árabes que apelaram aos palestinos, por meio de transmissões de rádio, para que eles deixassem a Palestina abrindo caminho para os exércitos árabes expulsarem os invasores sionistas.
A pesquisa meticulosa, desde a década de 1950, provou que tais declarações de rádio nunca ocorreram, exceto as transmitidas pelas rádios árabes que apelavam para que os palestinos permanecessem firmes nas suas terras. Israel, por sua vez, não foi capaz de exibir uma única gravação para provar o que sua propaganda apregoava para livrar os sionistas das acusações de crimes de guerra e limpeza étnica.
Na verdade, as investigações provaram que programas de rádio sionistas encorajaram os palestinos a fugir fabricando mentiras para disseminar o pânico, como por exemplo, afirmando que uma epidemia de doenças contagiosas haviam começa a se espalhar entre os palestinos.
Tentar estabelecer o início da longa história de mentiras “oficiais” do sionismo é um desafio considerável. Mas é possível destacar algumas nesse universo quase tão infinito como o verdadeiro infinito. Uma delas, ainda no início do projeto sionista na Palestina, era que os sionistas europeus não tinham nenhuma intenção de tomar as terras dos palestinos ou de expulsá-los.
Em 1923, os palestinos protestavam, junto autoridades coloniais britânicas, se queixando que os sionistas estavam tentando roubar a Palestina expulsando seus habitantes nativos. O Alto Comissário Britânico para a Palestina, Herbert Samuel, um judeu sionista britânico rejeitou os protestos e queixas dos palestinos descrevendo-os como infundados. Nas suas reuniões com o governo britânico, em 1923, Herbert Samuel, certamente o “homem certo no lugar certo”, considerou a oposição palestina ao sionismo, apenas com um “mal-entendido” dos objetivos reais do movimento sionista e que seus líderes não tinham intenção de confiscar terras árabes ou de inundar o país com imigrantes judeus europeus.
Outro aspecto que deve ser lembrado que os habitantes de Gaza foram expulsos, ou são descendentes daqueles expulsos de terras adjacentes à Gaza anexadas ilegalmente após a Nakba. Ainda mais grave é o fato que o projeto sionista que pretende expulsá-los para o deserto do Sinai para morrer também não é novo.
A Assembleia Geral das Nações Unidas, em dezembro de 1948, adotou a Resolução nº 194 exigindo que Israel devolvesse aos palestinos as terras que agora foram atacadas pelo Hamas. Esta resolução é anualmente reafirmada e solenemente ignorada pelo estado sionista e constitui a essência da política barbara sionista até os dias de hoje.
No entanto, nem as Nações Unidas, nem qualquer um do seus membros, notadamente aqueles sujeitos aos desejos dos Estados Unidos, ousaram exigir que os palestinos expulsos de Gaza deveriam ser autorizados a regressar às suas terras e casas na região ilegalmente anexada a Israel, como exigido pelo Direito Internacional e pelas resoluções das Nações Unidas.
Tampouco António Guterres, Secretário-geral da ONU, habitualmente humilhado pelo estado sionista e aqueles que o apoiam, se atreveram a fazer tal pedido, pois sequer responsabilizaram Israel pela sua contínua violação das resoluções da ONU. Foi apenas o Presidente egípcio Abdel Fattah al-Sisi, pasmem, que em resposta a pressão israelense, europeia e americana para permitir que Israel expulsasse os palestinos para o Egito, sugeriu a transferência do palestinos para o deserto do Negev localizado em terras palestinas anexadas à Israel.
Uma das muitas mentiras de Israel, depois de 1967, é que os palestinos que permaneceram em territórios ocupados seriam considerados “reféns” até que os árabes concordassem em reconhecer e normalizar as relações com Israel. Isto foi incorporado na formula israelense e americana do princípio de “terra em troca de paz”. Dadas ao currículo de mentiras israelense é difícil para qualquer pessoa (incluindo a Autoridade Palestina e outros líderes árabes, que por vezes fingem acreditar nelas) acreditar que realmente tivessem a intenção de negociar terra por uma paz duradoura, exceto os muito crédulos.
Quanto a prática de raptar civis, como reféns, para negociar a libertação de prisioneiros, trata-se, na verdade, de uma inovação puramente sionista, pois foi Israel quem introduziu esta prática no Oriente Médio, ou melhor, no mundo inteiro. Em dezembro de 1954, aviões de combate israelenses sequestraram um avião civil sírio. O objetivo era manter os seus passageiros como reféns para trocá-los por quatro soldados israelenses que se encontravam detidos na Síria. O então primeiro-ministro de Israel, Moshe Sharett, afirmou nas suas memórias, que o Departamento de Estado dos EUA o informou que “esta operação não tinha precedentes na História”.
Como a condenação internacional de Israel impediu a utilização dos passageiros raptados num acordo de troca, Israel lançou um ataque à Síria, um ano depois, em dezembro de 1955, matando 56 sírios, incluindo três mulheres, e raptando 30 sírios como reféns para troca com os quatro soldados israelenses. Os Estados Unidos expressaram então o seu “choque” com o crime de Israel e apoiaram uma resolução emitida pelas Nações Unidas condenando a violação da linha de armistício por parte de Israel.
Embora o sequestro de civis como reféns seja ilegal, a tentativa de apresentar os palestinos como “bárbaros sequestradores” não se sustenta, pois eles, enquanto israelenses “civilizados”, já haviam sequestrado por anos a fio, mais de 8.300 palestinos mantidos até hoje em suas prisões, incluindo 85 mulheres e 350 crianças (Israel raptou mais de 2.000 reféns só na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental desde 7 de Outubro).
Desde 1967, Israel mantém como reféns todo o povo palestino que vive na Cisjordânia, em Gaza e em Jerusalém Oriental. Desde 2005, Israel manteve prisioneiro os habitantes de Gaza na maior prisão ao ar livre do mundo e está agora a exterminá-los, a menos que concordem em mudar-se. Portanto, a condenação do Ocidente ao Hamas por manter civis israelenses como reféns (seu número é muito pequeno comparado ao número de civis palestinos sequestrados por Israel antes ou depois de 7 de outubro) como um ato “terrorista” apenas confirma a hipocrisia absoluta dos valores “universais” de um Ocidente liberal e racista.
Em vez de apoiar Israel na sua guerra genocida, os americanos, britânicos e europeus deveriam ter instruído os seus compatriotas, travestidos em colonos ilegais na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental, a evacuarem os territórios ocupados e regressarem aos seus países de origem. Em 2017, estimou-se que cerca de 65.000 cidadãos americanos eram colonos apenas na Cisjordânia (ou seja, 15 por cento do número total de colonos nessa altura), sem incluir o seu número em Jerusalém Oriental. Estes colonos constituem aproximadamente um terço dos 200.000 colonos americanos que vivem em Israel e nos territórios ocupados, e muitos deles, possuem educação universitária e se consideram “liberais” e “esquerdistas”.
O fato é que pelo menos um milhão de judeus israelenses possuem cidadania europeia e americana. Portanto, os Estados Unidos e os países europeus deveriam pressioná-los a regressarem aos seus países de origem, inclusive para a sua segurança, assim permitindo que os palestinos, em Gaza, retornassem para onde foram expulsos em 1948 cumprindo dessa maneira as resoluções das Nações Unidas.
Nenhum líder árabe, muito menos a Autoridade Palestina, ousou fazer tais exigências, secretamente ou publicamente, aos americanos e aos europeus. No entanto, essas demandas são consoantes com o Direito Internacional e contribuiriam sobremaneira para frear a política agressiva de Israel que insiste em manter uma política baseada na superioridade racial judaica e no colonialismo sionista.
A escala da brutalidade cometida por Israel, desde 7/10 excedeu a escala de suas guerras anteriores. A limpeza étnica sionista, entre 1947/1948, para ocupar a Palestina causou a morte de mais de 13.000 palestinos, mais de 11.000 dos quais eram civis (sem contar os 3.700 soldados árabes regulares e voluntários irregulares que morreram na guerra). A invasão israelense do Líbano, em 1982, causou a morte de mais de 18 mil civis palestinos e libaneses. Até esta data, a campanha genocida de Israel, em Gaza, matou mais de 20.000 civis palestinos (quase 15.000 mortos confirmados e mais de 6.000 desaparecidos sob os escombros) superando o recorde sionista de massacres anteriores.
O governo israelense, desde 1948, tem promovido uma torrente de mentiras sobre o povo palestino, sobre a “democracia” do seu estado colonial e sobre o seu sistema de superioridade racial judaica. No entanto, o fato, nessa altura de domínio público, é que as narrativas mentirosas sionistas mesmo tendo sido, uma por uma, completamente desmoralizadas, Israel continua operando sua máquina de propaganda graças a cumplicidade criminosa do Ocidente. A consequência trágica dessa simbiose toxica é que a calúnia, a falácia e a injustiça dos israelenses sempre triunfarão porque se baseiam no racismo sistêmico contra palestinos, árabes e muçulmanos no Ocidente.
Fonte: https://arabi21.com/story/1554686 (25/11/23)