Batalhas ganhas e perdidas. A guerra continua.

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Por Jim LobeIPSnews, Washington. Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu.

Há oito anos, Jeffrey Goldberg, da revista New Yorker, perguntou a Stephen Rosen, então alto funcionário do Comitê para Assuntos Públicos EUA-Israel [orig. American Israel Public Affairs Committee (AIPAC)] e conhecido em Washington pela agressividade, pensamento conservador e violência política, se uma então recente publicidade negativa havia abalado o legendário controle que o lobby tinha sobre a política de Washington.

“Um semi-sorriso apareceu no rosto de Rosen” – escreveu Goldberg sobre aquela entrevista. – “Está vendo esse guardanapo?” – perguntou-me ele. – “Em menos de 24 horas podemos ter aqui a assinatura de 70 senadores, bem aqui, nesse guardanapo”.

Oito anos depois, o mesmo funcionário, Stephen Rosen, que foi forçado a demitir-se do AIPAC depois de ter sido acusado – adiante, foi absolvido – de espionar a favor de Israel, disse a Ron Kampeas da Agência Telegráfica Judaica [orig. Jewish Telegraphic Agency (JTA)] que o AIPAC teve de abandonar a posição de confrontação contra o presidente Obama, depois de só ter conseguido 59 assinaturas de senadores – e quase todos, exceto 16, Republicanos – de apoio a uma nova lei de sanções contra o Irã que visava a fazer gorar completamente as negociações nucleares entre o Irã e o chamado grupo P5+1 (EUA, Grã-Bretanha, França, Rússia, China, mais Alemanha).

Eles não querem ser vistos em posição derrotada, nem como desistentes… Mas acho que a postura confrontacional não é sustentável – disse Rosen.

Se tivesse obtido as 70 assinaturas necessárias para aprovar novas sanções – as quais o governo argumentava que violariam um acordo provisório de 24/11 entre o Irã e o P5+1 (que congela o programa nuclear iraniano em troca do alívio em algumas sanções, por um período renovável de seis meses), o AIPAC teria três assinaturas a mais, além do número de votos necessários para derrubar o veto de Obama.

Mas, ao reunir os 59 co-patrocinadores da lei das novas sanções, depois do recesso de Natal, foi como se o AIPAC e os autores do projeto de lei, senadores Mark Kirk (Rep.) e Robert Menendez (Dem.), colidiram de frente contra uma muralha de resistência liderada por dez Democratas da Comissão e apoiada por uma Casa Branca surpreendentemente determinada, com discurso estranhamente muito firme.

Se alguns membros do Congresso desejam que os EUA ajam militarmente, eles que apareçam e digam claramente à opinião pública dos EUA – disse Bernadette Meehan, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional. Se nada dizem, fica-se sem saber por que algum membro do Congresso apoiaria uma lei que praticamente fecha as portas a qualquer diplomacia e põe os EUA muito mais próximos de ter de escolher entre ou a opção militar ou deixar que prossiga o programa nuclear do Irã.

Assim aconteceu que a Casa Branca venceu o AIPAC naquela queda-de-braço. E surgiu a questão de saber quanto poder o AIPAC ainda tenha. (…)

A incapacidade do AIPAC para mobilizar mais apoiadores entre os Democratas, principalmente, foi efeito de dois revezes que o grupo sionista sofreu ao longo do ano passado.

Embora o AIPAC não se tenha manifestado publicamente, sabe-se que o lobby trabalhou em silêncio contra a nomeação do ex-senador Republicano, Chuck Hagel, para o posto de Secretário da Defesa, por causa da atitude em geral crítica de Hagel contra a influência de Israel na política dos EUA para o Oriente Médio.

Vários grupos e indivíduos alinharam-se firmemente com o AIPAC, especialmente o Comitê Judeu-Norte-americano [orig. American Jewish Committee] e a Liga Antidifamação [orig. Anti-Defamation League (ADL) – dois grupos que se uniram ao AIPAC no lobbying a favor da lei de novas sanções contra o Irã – na oposição à indicação de Hagel. Mas, afinal, a indicação foi confirmada no Congresso, com 58 votos a favor e 41 contra, com a grande maioria dos Democratas votando a favor de Hagel.

Na sequência, oito meses depois, o AIPAC e outros grupos judeus de direita fizeram lobby no Congresso a favor de uma resolução favorável ao uso de força militar contra a Síria – embora, dessa vez, o Congresso tenha sido acionado por Obama, mas com a aprovação do primeiro-ministro “Bibi” Netanyahu de Israel.

Mas o gigantesco protesto popular contra qualquer intervenção militar norte-americana em mais um conflito do Oriente Médio – além da aversão “automática” da extrema-direita Republicana a virtualmente qualquer iniciativa de Obama – fez gorar o movimento dos sionistas.

Nem Hagel, nem a Síria têm, sequer aproximadamente, a mesma importância que o AIPAC atribui ao Irã e ao programa nuclear iraniano, que dominam a agenda de política exterior do grupo há mais de uma década. Ao longo desse tempo, os sionistas norte-americanos habituaram-se a mandar e desmandar sobre amplas maiorias de senadores e deputados dos dois partidos, com a política de sanções e outras leis criadas para aumentar cada vez mais as tensões – e impedir qualquer movimento de reaproximação ou “aquecimento” nas relações entre Teerã e Washington.

Em julho do ano passado, por exemplo, a Câmara de Deputados aprovou, por 400 votos a favor e 20 contra, uma legislação de sanções para bloquear todas as exportações de petróleo do Irã. As medidas foram aprovadas apenas quatro dias antes da posse do presidente Hassan Rouhani em Teerã.

Durante todo o outono, o AIPAC trabalhou duro – mas, afinal, sem qualquer sucesso – para fazer aprovar a mesma lei também no Senado.

Agora, dois meses adiante, e incapaz de arregimentar sequer 60 votos (o mínimo indispensável para impedir a obstrução regimental [orig. filibuster]) no Senado, o AIPAC parece já ter engavetado o projeto de lei “Kirk-Menendez”, que, dentre outras provisões, teria imposto novas sanções ao Irã se o país violasse o acordo de 24/11 ou não alcançasse, no prazo máximo de um ano, acordo satisfatório com o P5+1, sobre seu programa nuclear.

“É perfeitamente visível que as coisas mudaram, e o AIPAC e outros grupos que fizeram lobby muito ativo [a favor de novas sanções contra o Irã] sofreram dura derrota” – escreveu Lara Friedman, militante do grupo judeu Americans for Peace Now, em seu blog; e outros comentaristas, entre os quais Rosen, alertam que o apoio muito predominantemente Republicano à lei do AIPAC ameaça a imagem de bipartidarismo tão cuidadosamente cultivada pelo grupo sionista, e pode afugentar políticos e principais doadores Democratas.

“O AIPAC perdeu, sim, sem dúvida, esse round; e essa derrota custou-lhe imensa quantidade de capital político e de prestígio dentro do governo e no cálculo de muitos Democratas” – disse um veterano observador do Capitólio. O mesmo observador comentou que “o AIPAC enfrentou tempestade quase perfeita”: o governo lutando por uma política que também tinha amplo apoio entre os mais altos quadros da elite da política exterior e, também, de grupos de ativistas e movimentos de base, que pressionaram seus senadores e deputados. “Os gabinetes dos senadores recebiam um ou dois telefonemas a favor [daquele projeto de lei], e centenas contra! Não há dúvida de que isso pesou muito”.

O AIPAC e outros grupos linha-dura continuam a ser poderosa força para assegurar generosa ajuda dos EUA a Israel, e para boicotar quaisquer esforços que os EUA façam na direção de uma solução de dois estados. Mas o poder do AIPAC diminui sempre que os sionistas põem-se a trabalhar na direção de mais guerras no Oriente Médio – escreveu-nos Stephen Walt, coautor de The Israel Lobby and U.S. Foreign Policy, em mensagem de e-mail.

Os neoliberais e neoconservadores conseguiram empurrar Bush & Co. para a invasão do Iraque em 2003, mas o sucesso, naquele caso, contou com um conjunto excepcional de circunstâncias. O público norte-americano aprendeu muito, daquela experiência desastrosa – continuou Stephen Walt.

Mas ninguém crê que o AIPAC e seus aliados tenham desistido. Se as negociações do P5+1 derem em nada, a lei “Kirk-Menendez” será rapidamente reapresentada; de fato um influente senador Republicano já disse que a lei deve ser incluída na agenda de julho, seis meses depois do dia 20 de janeiro, data em que o acordo provisório de 24/11 entrou formalmente em vigência.

Tudo faz crer que [os defensores daquela lei] estão-se preparando para iniciar uma espécie de Plano B [o qual] (…), parece, será igual ao Plano A; mas, em vez de visar a fazer gorar as negociações usando mais sanções, o “novo” plano cuidará de impor condições sobre qualquer acordo final a que se chegue algum dia; condições que sejam impossível de satisfazer e, assim, sempre matarão qualquer possibilidade de acordo com o Irã – disse Friedman.

Entre essas condições impossíveis de satisfazer, há a exigência, como condição para levantar as sanções, de que o Irã ponha fim completo e total a qualquer tipo de enriquecimento de urânio em solo iraniano – condição a qual Netanyahu já se referiu várias vezes; que Teerã já rejeitou várias vezes; e que muitos especialistas entendem que poria fim a qualquer tipo ou possibilidade de acordo.

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