Netanyahu: O elefante branco no Congresso dos EUA 2

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Moara Crivelente *

Ele chegou lá. Após semanas de especulação sobre o mesquinho discurso do qual o primeiro-ministro de Israel Benjamin Netanyahu não abriu mão, no Congresso dos Estados Unidos, ele finalmente subiu ao palco e deu seu show. Nesta terça-feira (3), o condutor do tanque sionista que ameaça arrasar não só palestinos, em seu massacre permanente, quanto a maior parte da vizinhança, fez o que inúmeros críticos temiam e garantiu o espetáculo, a contragosto do presidente Barack Obama.

Jornal israelense Ynet (Yedioth Ahronoth) escolheu uma imagem caricata para noticiar
o discurso de um Netanyahu à vontade no Congresso dos EUA
As expectativas eram diversas nas semanas que antecederam o evento. Análises variadas rechearam os noticiários israelenses e estadunidenses sobre o caráter estratégico ou, por outro lado, sobre o erro de manobra na decisão de Netanyahu de passar por cima das “advertências” da Casa Branca e aparecer no Congresso para atacar especialmente as negociações sobre o programa nuclear do Irã. Uma das principais retóricas do regime sionista para justificar sua constante posição ofensiva na região é a alegação ufanosa de que os persas constroem armas nucleares especificamente “para destruir Israel”.

As inúmeras análises que dominaram grande parte da mídia dos dois países sobre o despeito de Netanyahu foram atravessadas por poucas vozes. A empreitada é apresentada por ele como um alerta aos cidadãos estadunidenses contra o que considera ser a irresponsabilidade fatal de Obama: as negociações com o Irã.

Nos noticiários não sobrou espaço para a contraposição à visão sobre o programa nuclear iraniano, classificado de bélico pelas potências ocidentais e por Israel, que possui suas próprias ogivas nucleares não declaradas ou averiguadas pelas agências internacionais. O cinismo desta situação criada para que os EUA e a União Europeia justificassem suas sanções contra o Irã e para que Israel explique seu acosso constante não tem lugar na mídia, dominada por avaliações em tom estratégico a respeito do imbróglio.

Além disso, às vésperas das eleições em Israel – adiantadas devido à fragmentação do governo Netanyahu – pouco se fala da ocupação da Palestinacomo fator de ponderação na conjuntura eleitoral e, menos ainda, do relatório que deve ser divulgado nos próximos dias pela comissão de inquérito do Conselho de Direitos Humanos da ONU, sobre os crimes de guerra israelenses. O espetáculo foi apenas de Netanyahu e da torrente de avaliações sobre o impacto da sua “teimosia” nas relações Israel-Estados Unidos. Entretanto, todos os que acompanham este histórico entendem que a tensão é pontual. Uma amostra disso foi a entrevista de Obama nesta segunda-feira (2) à Reuters, em que sua mudança de tom foi notada.

Para o presidente – que antes soava irritado com a resposta de Netanyahu ao convite dos rivais republicanos para o discurso no Congresso – a decisão é “uma distração” do real objetivo, segundo alega o seu governo, de “impedir um Irã com armas nucleares”. Obama não se reunirá com Netanyahu, mas ainda assim, disse: “Não penso que isso seja permanentemente danoso para as relações entre Estados Unidos e Israel”, elencando demonstrações da aliança inquebrantável: os bilhões de dólares gastos pelos EUA na “segurança” de Israel e a cooperação em temas de inteligência em níveis sem precedentes, um recorde que o presidente enfatizou. Poderia ter mencionado também a negligência criminosa diante dos repetidos massacres dos palestinos, nos quais os EUA tiveram papel direto com o fornecimento de armas, caças de combate, o financiamento do “escudo antimíssil” Cúpula de Ferro, entre tantos outros equipamentos bélicos.

Na véspera do midiatizado discurso de Netanyahu, a Casa Branca emitiu um boletim intitulado “Cinco fatos que você precisa conhecer sobre as relações EUA-Israel com Obama”, afirmando que “o engajamento americano com Israel cresceu e fortaleceu-se em um grau inédito”, listando a cooperação estadunidense na área militar – de “defesa”, segundo a propaganda imperialista e sionista – e no cenário internacional, onde os EUA “têm sido um forte aliado do Estado judeu”, além de laços comerciais.

Netanyahu também viajou aos EUA para participar da convenção do Comitê Americano de Relações Públicas de Israel (Aipac), o agressivo lobby israelense entranhado no Congresso a níveis constrangedores. Em discurso na convenção, na segunda, Netanyahu parecia saudar fãs em um show em que a maior atração seria uma posição raivosa contra o Irã e a pressão por mais sanções. O premiê opõe-se ao Plano de Ação Conjunta assinado entre o Grupo 5+1 e o governo persa, explicado a Netanyahu pelos EUA, o que levantou a preocupação de que ele faça revelações prejudiciais às negociações.

Já na corrida eleitoral, a ausência do tema ocupação da Palestina e o regime de opressão é outro constrangimento, o que análises explicam com a falta de confiança por parte dos israelenses na chamada solução de dois Estados. Moshe Arens, em artigo no jornal israelense Haaretz, elencou o que vê como motivos desta desilusão com mais ataques contra os palestinos, sempre culpados pela falta de progresso nas esparsas negociações. Arens ignora quase uma década para insinuar que, mesmo com a assinatura dos Acordos de Oslo, a partir de 1993, os palestinos rebelaram-se na segunda intifada (“levante”), em 2000, quando sete anos evidenciaram que a ocupação não iria a lugar algum.

Para Gideon Levy, no outro extremo, “Israel está galopando para a próxima guerra contra os palestinos como se tratasse de um desastre natural que não pode ser evitado”, embora os eleitores pareçam não ter isso em vista. “Não importa quem será o primeiro-ministro”, diz o colunista também do Haaretz, que afirma seu descrédito na lista liderada pelo Partido Trabalhista (denominada “Campo Sionista”), já em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de votos, com previsão de angariar 24 assentos no Parlamento, contra o Likud de Netanyahu imediatamente em segundo, com 23 assentos, a Lista Árabe Conjunta em terceiro, com 13 assentos, e em quarto, com 12 assentos, o Habayit Hayehudi (“Lar Judeu”), liderado pelo expoente e agressivo porta-voz dos colonos israelenses em territórios palestinos, Naftali Bennett, para quem um Estado palestino não pode existir. Tipos como este poderão ser incluídos na coalizão de governo resultante.

Parece evidente que uma solução desejável oriunda da sociedade israelense continua adiada. Ainda cabe à “comunidade internacional” cumprir seu compromisso com a libertação da Palestina e a responsabilização da liderança israelense.

* Cientista política, jornalista e membro do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz), assessorando a presidência do Conselho Mundial da Paz.

* Opiniões aqui expressas não refletem necessariamente as opiniões do site.

 

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2 thoughts on “Netanyahu: O elefante branco no Congresso dos EUA

  1. Responder Ramez mar 4,2015 19:47

    Em bom português, embora haja esta embromação de “negociações com o Irã”, a elite ianque está declarando aliança total com Israel e guerra ao Irã. Já sabemos desde agora, que o próximo ditador ianque, sucessor de Obama, será totalmente hostil ao Irã, Síria e Hizbollah. (E quem sabe, ao Egito de al-Sissi). Os Republicanos deixam claro, NÃO HAVERÁ acomodação com o Irã e Síria.

  2. Responder Cleumer mar 5,2015 10:50

    IRAN PRECISA DE ENERGIA TODOS PRECISAMOS GUERRA
    😉 GUERRA SEJA ECONOMICA OU NUCLEAR

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