ISIS e ‘Forças (curdas) de Defesa da Síria’: duas monumentais mentiras dos EUA  — Curdistão e as Novas Guerras do Gás

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4/10/2017, William Engdahl, New Eastern Outlook, NEO

Traduzido por Vila Vudu

The Big ISIS and SDF Lies of the US—‘Kurdistan’ and New Gas Wars


Manchetes dos principais veículos da grande mídia-empresa ocidental comemoraram a captura dos maiores campos de gás natural em torno da província síria de Deir Ez Zor como se fosse vitória da Síria. Exemplo dessas manchetes: “FDS [Forças de Defesa da Síria e/ou Forças Democráticas Sírias; ing. SDF, Syrian Defense Forces (são curdos)], Recaptura do Controle pelo ISIS Campo de Gás na Síria.” Atenção à palavra “recaptura” – que faz crer que o proprietário original dos campos de gás, o estado sírio, teria conseguido recuperar para si valiosos recursos econômicos roubados dele por terroristas do ISIS. A verdade é o contrário disso.

Uma Força Curda de Defesa da Síria, apoiada não pelo governo Assad de Damasco, mas pelo Pentágono e pelo exército israelense e outras forças hostis ao governo de Bashar al-Assad, acaba de anunciar que controla os principais campos sírios de gás originalmente desenvolvidos pela Texas Conoco Oil Company, petroleira com sede em Houston. O noticiário ocidental padrão da operação segue as linhas gerais de “Forças sírias apoiadas pelos EUA derrotaram o Estado Islâmico e recuperaram uma unidade de produção da empresa Conoco, na área rica em petróleo, de Deir Ez Zor, privando os militantes, de importante fonte de renda.”

Por trás desse quadro está ocultada a feia realidade de que soldados dos EUA servindo ao Pentágono foram expostos como ponta de lança a serviço de terroristas do ISIS e dos curdos da FDS. O ISIS ocupava a província Deir Ez Zor e seus campos de gás e petróleo desde 2014, tirando do governo de Assad uma de suas principais fontes de renda e de energia.

Dia 24 de setembro, o Ministério de Defesa russo distribuiu imagens aéreas que mostravam equipamento de Forças Especiais do Exército dos EUA em locais onde operam militantes do ISIS ao norte da cidade de Deir ez Zor. As imagens mostram unidades do Exército dos EUA abrindo passagem para as Forças de Defesa [também chamadas Democráticas] da Síria, predominantemente curdas, deixando-as atravessar as formações de combate de terroristas do Estado Islâmico – como disse o Ministério russo, em declaração:


“Sem qualquer resistência dos militantes do ISIS, tropas das Forças de Defesa da Síria estão-se deslocando ao longo da margem esquerda do rio Eufrates em direção à cidade de Deir ez-Zor” –como se lê na declaração.


A declaração do Ministério da Defesa em Moscou prossegue:

“Apesar de haver postos das forças armadas dos EUA nos locais onde estão atualmente tropas do ISIS, não se vê nenhum sinal de que ali haja posto avançado para atividades de combate.”

Obviamente, o pessoal militar dos EUA sente-se perfeitamente seguro no centro de território controlado pelo ISIS.

Como observou Thierry Meyssan, especialista francês em questões do Oriente Médio, que tem base em Damasco,

“Em agosto, o Pentágono anunciou uma concorrência para compra e transferência de armas e munição, principalmente de fabricação soviética, no valor de 500 milhões. Os primeiros 200 caminhões foram entregues aos curdos em Hasakah, dias 11 e 19 de setembro, através do Curdistão iraquiano, sem serem atacados pelos jihadistas (ISIS e assemelhados).”


Assim se confirma que sejam forças curdas treinadas e armadas pelos EUA chamadas FDS, seja o ISIS e outros ‘representantes’ locais dos EUA estão sendo usados em conjunto para proteger regiões estratégicas de petróleo e gás que interessam aos EUA na Síria próximas da fronteira com o Iraque. Nessa área, curdos iraquianos, comandados por um déspota feudal apoiado por EUA e Israel, Massoud Barzani, acabam de votar em referendum e aprovar, por 92% dos votos, a ‘independência’ de um Curdistão iraquiano – movimento abertamente apoiado pelo governo de Netanyahu em Israel e, por trás das cortinas, também por Washington.

Já em 2015, segundo matéria do Financial Times de Londres, Israel importava do “Curdistão iraquiano” controlado por Barzani a alta porcentagem de 77% do petróleo que consumia.

Agora o plano de longo prazo do Pentágono, delineado pela primeira vez em 2006 num artigo do US Armed Forces Journal, para um Curdistão independente custeado e apoiado por EUA e Israel extraído dos territórios de Iraque, Síria e até da Turquia, país membro da OTAN e, afinal, também do território do Irã, emerge afinal à luz do dia. Até agora, aquele plano permanecera quase completamente escondido nas sombras de mais de seis anos de uma guerra patrocinada pelos EUA e financiada, na maior parte, pelos sauditas, para depor o governo eleito legítimo de Bashar al Assad e um dos maiores obstáculos à planejada balcanização de toda a região.

Guerra contra o terror, ou guerra com ajuda do terror?

A mentira do Pentágono, segundo a qual Washington estaria lutando na Síria para destruir terroristas do ISIS – e que é movimento de agressão norte-americana, ilegal nos termos da lei internacional e que agride país soberano assim reconhecido pela Carta da ONU – está agora plenamente exposta pelo que realmente é: mentira. O Pentágono e a CIA e seus vários matadores de aluguel, como já foram várias vezes acusados, criaram o ISIS dos restos de sua Al Qaeda no Iraque e na Síria, num esforço para derrubar Assad e assumir o controle das reservas estratégicas de petróleo e gás e rotas dos oleodutos e gasodutos. Agora, afinal, todos veem que o que está em jogo é o futuro da energia não só da Síria, mas, potencialmente, da União Europeia e da Ásia.

Não foi ideia saída do nada diretamente para a cabeça do general ‘Cachorro Louco’ Mattis, o Pentágono usar curdos sírios para chegar ao controle de corredores de energia chaves na Síria depois que todas as demais tentativas fracassaram. O plano começa pelo menos naquele artigo de 2006 , no US Armed Forces Journal, assinado pelo coronel Ralph Peters. Ali Peters delineou um plano para redesenhar radicalmente as fronteiras de todo o Oriente Médio pós-1ª Guerra Mundial. Diz ele:

“Um Curdistão livre, que se estenda de Diyarbakir até Tabriz, seria o estado mais pró-Ocidente entre a Bulgária e o Japão.” E continua: “A injustiça mais flagrante nas terras notoriamente injustas entre as montanhas Bálcãs e os Himalayas é a ausência de um estado curdo independente. Há entre 27 milhões e 36 milhões de curdos vivendo em área contínua no Oriente Médio”.


Peters fala até de um provável referendum sobre a independência entre os curdos iraquianos, no qual “praticamente 100% dos curdos iraquianos votarão pela independência.” Aconteceu, e o resultado, de estilo soviético foi 92% dos votos pela independência, com notícia de episódios de severa intimidação dos votantes, pelos bandidos do clã Barzani, tipo “vote sim, ou aguente as consequências”. O próprio Barzani é acusado de ter acumulado fortuna de vários bilhões, graças a práticas corruptas que comanda com membros da família.

No verão passado, antes da reunião dos G20 em Hamburgo, o presidente dos EUA anunciou que estaria cortando fundos da CIA e do Pentágono para a guerra contra o terrorismo jihadista na Síria e no Oriente Médio.

O que agora se vê claramente é que, em vez de ser usado para treinar o que na verdade sempre foram terroristas do ISIS e de outros grupos e mandá-los combater contra Assad, batalha na qual os mercenários jihadistas passaram a ser amplamente derrotados depois que a Rússia engajou-se em setembro de 2015, o dinheiro dos EUA estava sendo desviado para brigadas militares curdas, as chamadas Forças de Defesa (às vezes ditas “Democráticas”) da Síria (FDS).

Depois da fala de Trump, foram embarcadas quantidades gigante de armas fornecidas pelos EUA destinadas aos curdos da FDS, inclusive metralhadoras pesadas, morteiros, armas antitanques, carros blindados e equipamento de engenharia. Em maio passado, Trump assinou autorização para armas as milícias curdas das FDS. Em junho, 348 caminhões com equipamento militar chegaram ao grupo, como noticiou a agência de notícias turca Anadolu. Segundo os dados da agência, a lista de armas do Pentágono a ser entregue ao grupo inclui 12 mil rifles Kalashnikov, 6 mil metralhadoras, 3 mil lança-granadas e perto de mil antas antitanques de origem russa ou norte-americana.

Agora já está claro que aquelas armas dos EUA embarcadas para as forças curdas na Síria visavam a uma nova guerra contra o Exército Árabe Sírio de Bashar al Assad, guerra para impedir que as tropas de Assad recuperassem as terras ricas em petróleo e gás em torno de Deir ez-Zor.

No início de setembro, as forças do exército de Assad com apoio do Hezbollah e cobertura da Força Aérea russa, finalmente rompeu um sítio de três anos do ISIS em torno da cidade vitalmente importante de Deir ez-Zor, coração das reservas sírias de petróleo e gás. Ao mesmo tempo, as forças curdas FDS apoiadas e agora já pesadamente armadas pelos EUA capturavam os ricos campos de gás do norte de Deir ez-Zor. O enviado especial do presidente dos EUA para a Coalizão Global contra o ISIL (ISIS/EI/Daech), Brett H. McGurk, reuniu-se dia 18 de agosto com líderes tribais locais que, supostamente, teriam sido subornados para jurar obediência ao ISIS. Agora já estão seguindo o dinheiro e voltaram a apoiar os curdos sírios das FDS-EUA e contra o mesmo Assad.

Mais recentemente, os EUA prepararam um ex-combatente terrorista do ISIS, Ahmad Abu Khawla, para comandar seu recém criado Conselho Militar Deir Ez Zor controlado pelas Forças Especiais dos EUA. Abu Khawla é ladrão de carros condenado, chantagista e bandido de quatro costados. Do ISIS para os curdos das FDS, tanto faz, desde que o dinheiro não pare de jorrar.

Mas por causa dos recentes sucessos do Exército Árabe Sírio e forças aliadas apoiadas pela Força Aérea russa, a batalha está-se convertendo em confronto direto entre EUA e Rússia – situação que absolutamente não contribui para a paz mundial.

Mais uma vez, como em outros momentos de sua história, os curdos sírios e os curdos iraquianos estão sendo usados como coringas pelas grandes potências para jogarem o jogo do ocidente: controlar os grandes recursos de energia de todo o Oriente Médio e, com isso, de grande parte do mundo. Esse jogo fracassará, mas não, infelizmente, antes que a morte colha seu butim de carne humana.

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