2015: Um ano inflamado para o governo francês

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Paris (Prensa Latina) Importantes temas em matéria política e econômica integram as prioridades da agenda do governo francê para 2015, um ano considerado essencial face às eleições presidenciais de 2017. O presidente François Hollande tem grandes desafios, sobretudo porque se encontra na segunda metade de seu mandato com um balanço negativo em matéria de luta contra o desemprego, o crescimento da economia, a redução do déficit público e a dívida.

As más notícias continuam no mercado de trabalho francês, após se informar que o desemprego cresceu novamente em novembro, mês em que marcou um novo recorde.

O número de pessoas sem trabalho chegou a 3,48 milhões, o que representa um aumento de 0,8% com respeito a outubro e um aumento de 5,8 pontos na comparação interanual, segundo as mais recentes estatísticas difundidas pelo estatal escritório Pôle Emploi.

Se acrescentam-se as pessoas que exerceram alguma pequena atividade e as que estavam em busca de trabalho, a cifra chega aos 5,17 milhões, acrescentou.

Uma das últimas medidas do governo Executivo com o fim de tentar mudar a situação atual é o chamado Pacto de Responsabilidade que entrou em vigor no passado 1 de janeiro.

Dito programa consiste em outorgar ao setor privado exonerações de cargas fiscais em um valor de 30 bilhões de euros de agora a 2017, em troca de gerar novas fontes de trabalho e investir mais no país.

Por sua vez, os principais sindicatos consideraram o Pacto de Responsabilidade como um presente aos patrões, que se negam a se comprometerem com a criação de um número fixo de postos de trabalho.

Analistas vinculam a situação do mercado de trabalho ao estancamento do Produto Interno Bruto (PIB) como consequência das medidas de austeridade aplicadas na Eurozona para conter o aumento do déficit e a dívida pública.

ENDIVIDAMENTO-CRESCIMENTO

O débil crescimento da economia francesa é um dos elementos que mais pesa sobre o aumento de uma dívida pública que supera os dois trilhões de euros.

Em 1974, o débito do país era de só 12% do PIB; em 1981 atingiu 50 e agora se aproxima a 100%, bastante acima do 60 estipulado pela União Europeia, segundo estudos divulgados.

Dados brindados pelo Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos refletem que no terceiro trimestre de 2014 o endividamento atingiu 95,2% do PIB, frente a 95,1 dos três meses anteriores.

Também seu déficit orçamental aumentou para 4,6 % desde o 4,5 precedente.

Uma nota de conjuntura do Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos (Insee) revelou que em cada um dos dois primeiros trimestres do ano em curso o PIB subirá em três décimos de ponto.

Se estas previsões se confirmam, seria possível que o PIB atinja 0,7% em 2015, apontou o instituto.

De acordo com Hollande, este anúncio coincide plenamente com os objetivos propostos pelo governo na lei de finanças aprovada recentemente no Parlamento.

Contudo, o certo é que o Executivo não tem conseguido cumprir os objetivos estipulados pela União Europeia de um déficit fiscal de 3% do PIB e uma dívida pública de 60%.

INICIATIVA “MACRON” E REFORMA TERRITORIAL

Nesse contexto, o governo também põe suas esperanças em outra de suas iniciativas: a denominada Lei sobre a Atividade e o Crescimento, um projeto destinado à reativação econômica que gera controvérsias inclusive no seio do oficialista Partido Socialista (PS).

Conhecida como “Lei Macron” (em alusão ao ministro de Economia, Emmanuel Macron), será discutida proximamente na Assembleia Nacional.

Um dos pontos polêmicos do texto é a autorização do trabalho aos domingos nos grandes shoppings e outros estabelecimentos.

O projeto prevê aumentar de cinco a 12 o número de domingos em que se trabalha no país, uma medida recusada pelo primeiro-secretário do PS, Jean-Christophe Cambadélis, quem considera esse número demasiado elevado.

Outro assunto objeto de questionamentos é o de favorecer a participação do capital privado em vários setores até agora em mãos do Estado, como o transporte de passageiros.

Enquanto isso, a reforma territorial, recentemente aprovada pela Assembleia Nacional da França, é outro dos pontos defendidos com maior força pelo governo Executivo, apesar de provocar mal-estar em algumas regiões muito arraigadas aos seus respectivos espaços geográficos.

A partir de 2016, o país terá 13 regiões e não as 22 atuais. A medida encontra apoio em parte da população e reticência naquelas zonas que têm culturas e identidades mais diferenciadas.

Segundo o governo, o objetivo é simplificar a ação pública e economizar recursos.

Suprimir a metade destes organismos administrativos é um dos meios para economizar 50 bilhões de euros no orçamento nacional, como propôs o primeiro-ministro Manuel Valls quando apresentou a iniciativa a princípios de 2014.

GOVERNO INSISTE, PESE A QUESTIONAMENTO

Não obstante as críticas, o presidente Hollande assegura que manterá o rumo das medidas políticas, econômicas e sociais para o que resta de seu governo e sua única promessa concreta foi que não haverá impostos suplementares a partir de janeiro de 2015.

No entanto, os franceses iniciaram o ano com uma longa lista de aumento de impostos e taxas em áreas como o transporte e o gás de uso doméstico, quando diminui o poder aquisitivo da população.

Em um contexto de crescentes problemas econômico e de divisões, inclusive no seio do PS, especialistas opinam que a direita é a mais beneficiada.

O mais inquietante é o fato de que os analistas não se referem só à direita tradicional principalmente aglutinada em torno da conservadora União Por um Movimento Popular (UMP), partido ao que pertence o ex-presidente Nicolas Sarkozy.

Advertem que a ultra-direita mais rançosa, encarnada na Frente Nacional, liderada por Marine Le Pen, tem ganhado posição, o que complica o cenário para as eleições departamentais e regionais do ano em curso.

Em março passado, na ocasião das eleições municipais, o PS sofreu um severo revés e perdeu a administração em umas 155 cidades, passando ao segundo lugar, depois da UMP.

Apenas uns meses depois, em setembro, as eleições parciais do Senado foram outro revés para o presidente Hollande, que perdeu a maioria na câmara alta do Parlamento, o que complica seu governo, ainda quando no país francês a última palavra em matéria legislativa é a da Assembleia.

Na nova configuração do Senado, a UMP e seus aliados da União de Democratas Independentes somam 189 assentos, bastante acima da maioria absoluta criptografada em 175.

Por sua vez, o PS, os ecologistas e o Partido Comunista Francês chegam em conjunto a 157 cargos, e o extremista Frente Nacional entrou pela primeira vez neste recinto, com dois representantes.

Outra prova de fogo para o presidente em 2015 será a discussão sobre duas iniciativas já em curso, a lei de reforma energética e o orçamento do Estado para 2015.

No âmbito internacional, a realização em dezembro deste ano em Paris da cúpula mundial sobre mudança climática, será um dos grandes acontecimentos no país, como o reconheceu Hollande durante a tradicional mensagem à nação para se despedir de 2014.

Farei todo o possível para que esse evento seja um sucesso e para poder dizer que a França contribuiu para preservar o planeta, acrescentou.

O ano de 2015 apresenta um caminho complexo e interessante na França, com um Executivo liderado por um presidente que registrou em 2014 os níveis mais altos de impopularidade de um presidente na chamada V República, iniciada em 1958, e muitos problemas econômicos por resolver.

* Correspondente da Prensa Latina na França.

 

 

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