Por que o Estado Islâmico atacou Kobane? 2

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15/10/2014, Hakkı Yükselen, Frente Operária,* Turquia, in Rebelión

http://www.rebelion.org/noticia.php?id=190806

Tradução Vila Vudu

Não há explicação simples. A resposta a essa pergunta poderia ser a seguinte, se passássemos por alto pelas razões estratégicas, políticas e ‘divinas’ mais profundas: para unir as áreas dominadas pelo ISIL, capturando os cantões da Rojava (“Curdistão Ocidental” em curdo, o chamado Curdistão da Síria), que criam uma desconexão física entre essas áreas — os distritos e as cidades no norte; e para chegar a Aleppo, centro econômico da Síria, desde o norte, depois da captura, depois de Kobane, de Afrin, mais ocidental. Mesmo assim, outro motivo possível seria: para capturar Cizre, que se encontra no extremo leste da Síria e tem um campo de petróleo importante (Rimela), o que permitiria ao ISIL ter sob seu domínio todos os campos de petróleo, garantindo fornecimento contínuo aos militares, com a organização e a logística também sob seu controle – dado que toda a fronteira com a República da Turquia estaria então sob controle do ISIL.


Se o
ISIL alcançar esses objetivos, terá capturado todas as grandes cidades no norte de Síria, o que significa todos os recursos econômicos significativos e os lucros do petróleo. Significa também que o ISIL já teria quase alcançado o mar. O certo é que esse cenário permitiria uma estrutura da organização de tipo estatal, para ser mais eficiente; e faria aumentar o número de seus partidários, bem como também daria ao grupo mais poder e maior reconhecimento no âmbito internacional. De um ponto de vista estratégico, e em largos traços, a situação é essa.

Quem fundou o ISIL?

Para começar, é obrigatório dizer que a ‘versão’ “anti-imperialista” de que os EUA e Israel teriam fundado o ISIL com o objetivo de intervir na região, não reflete a realidade. Por mais que esse tipo de ‘análise’ com ‘suspense narrativo’, nos livre de ter de lidar com “incômodas” ou “aborrecidas” razões históricas, sociais, econômicas e políticas no mundo e na região, essa ‘versão’ não passa de mera propaganda. Isso, claro, não significa que o ISIL seja “simplesmente” uma organização autóctone.


Pode-se facilmente dizer que o
ISIL manteve relações diretas e indiretas consideráveis com potências imperialistas, em particular com os EUA e com as forças regionais mais reacionárias, como Turquia e Arábia Saudita, e por longo tempo, pelo menos durante suas atividades contrarrevolucionárias na Síria. Essas relações converteram-se provavelmente em outras relações muito diversas, ao longo do tempo. E o ISIL também, às vezes, colaborou com o governo de Assad.

Mesmo assim, o poder do grupo não advém de ser “servo” do imperialismo, mas de sua capacidade para utilizar essa posição e as oportunidades que ela oferece, para alcançar seus objetivos independentes.
Por desgraça, o ISIL conseguiu converter-se numa potência político-social real, graças a sua autonomia organizacional e política, diferente dos velhos partidos comunistas na região, que se auto liquidaram frente aos governos autocrático-nacionalistas.

O plano de liquidação

Quanto à Turquia, o estado e o governo do
AKP levaram a cabo uma estratégia de liquidação, ou, se não de liquidação, de controle do movimento nacional curdo na Turquia sob o nome de “processo de resolução”. Essa mesma estratégia é agora a que se aplica no “Curdistão Ocidental”, o chamado Curdistão da Síria, em curdo, Rojava.   
Desde o princípio, o estado turco adotou uma atitude hostil ante a experiência de Rojava, já que aquela experiência seria exemplo perigoso para os curdos na Turquia. Esta hostilidade do estado aparece sob diferentes formas, como nas tentativas para bloquear o Curdistão Sírio (Rojava), com o fechamento das fronteiras – que haviam sido plenamente abertas pelo
ISIL – aos curdos; e o fornecimento de armas, “serviços de saúde” e comodidades logísticas, além da permissão para que o ISIL explorasse os próprios territórios, durantes seus ataques aos cantões. Dadas as diferenças entre o mundo ocidental e as estratégias políticas da Turquia com respeito à região, em especial com respeito à Síria, o governo do AKP foi posto sob forte pressão do Ocidente, quando afinal se revelou sua relação sangrenta com o ISIL.

Ao governo não interessava que o
ISIL acabasse com o  “Curdistão Ocidental”, o chamado Curdistão da Síria, em curdo, Rojava, e se convertesse em vizinho da Turquia na fronteira. Teria sido útil na guerra contra o governo do presidente Assad, embora a situação implique vários riscos. Mas o Ocidente optou por encaminhar uma “solução política” na Síria e começou a ver o ISIL como seu inimigo número um, o que invalidou gradualmente a melhor aposta do governo turco. Embora o governo turco evite guerra direta contra o ISIL, trouxe à discussão uma possibilidade de intervenção na situação, servindo-se dos refugiados como desculpa, para manter-se próximo de seu melhor cenário. Essa intervenção manifesta-se nas conversas sobre a criação de uma “zona de amortização” [buffer-zone (zona ‘tampão’)], com proibição de sobrevoo, ou no mínimo uma “zona protegida”, real ou falsa. Esse tipo de zona implicaria praticamente o fim da autonomia do “Curdistão Ocidental”, o chamado Curdistão da Síria, em curdo, Rojava.

Yalçın Akdoğan (vice-primeiro ministro) revelou a intenção do governo turco, de estrangular Rojava, quando disse que o memorando que aprova o envio de tropas para Síria e Iraque não afeta só o
ISIL, mas também outras organizações terroristas. O primeiro-ministro também confirmou esta intenção, quando falou sobre a possibilidade de uma zona de amortização, ou zona protegida: “Temos de continuar lutando contra as organizações terroristas separatistas persistentemente”. Enquanto isso, os assuntos relacionados com o regime sírio não saem da mesa; o governo turco exige, para unir-se à ‘coalizão’, que a derrubada do governo de Assad seja o segundo objetivo.

Quanto aos curdos…

Apesar da autoconfiança que a autonomia provocou no “Curdistão Ocidental”, o chamado Curdistão da Síria, em curdo, os curdos chegaram em curto período de tempo a ponto de pedir ajuda, e a pedem a quem esteja disposto a ajudá-los, sem se importarem com quem os ajude. Essa situação mostra os limites da democracia local e do projeto de autonomia democrática. Durante esses tempos de dificuldades, os curdos não enfrentam só a atitude hostil da Turquia. Também enfrentam a atitude de hostilidade de classe do governo de Barzani, que se salvou recentemente graças à ajuda dos bombardeiros dos EUA e graças ao
PKK-PYD, em certa medida.

Tudo isso faz ver que a verdadeira libertação e a liberdade do povo curdo não está em projetos isolados de democracia com ambíguo caráter de classe e/ou nos jogos diplomáticos de equilíbrio de poder. E está, exclusivamente, na luta comum dos trabalhadores e das massas populares da região, contra o imperialismo e o reacionarismo regionais; e contra a própria burguesia curda.
Quanto a nós…

Dito em forma resumida, estamos contra todo tipo de intervenção imperialista, não importa quais sejam ou possam ser suas razões. Mesmo que o objetivo seja destruir o
ISIL, ou seja qual for, somos contra o bombardeio feito pelos EUA, o bombardeio feito pelos estados do ocidente e árabes que estão em coalizão com os EUA, ou os projetos turcos de zonas ‘tampão’, zonas de amortização, ou ‘seguras’, ou tenham o nome que tiverem, que só complicam ainda mais a situação.

Além de tudo mais, o verdadeiro objetivo dessas potências é suprimir a dinâmica revolucionária no Oriente Médio, inclusive das massas populares curdas, que lutam por liberdade.
Por último, é preciso dizer algumas palavras ao Estado turco: Agora que finalmente aceitou oISIL como “organização terrorista”, é hora de romper todas as conexões diretas e indiretas com aquela organização!

Que se fechem as fronteiras ao
ISIL e se as abram a todos os que socorrem o povo do Curdistão Sírio (em curdo, Rojava). Que se criem todos os impedimentos e obstáculos para que YPG/YPJ se armem!

Com isso se verá claramente que não há necessidade de nenhum tipo de “coalizão”, de bombardeios ou de projetos de ninguém sabe que tipo de “zona”!
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*Frente Operária, é o jornal do Partido pela Democracia Operária da Turquia (UIT-CI).

 

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2 thoughts on “Por que o Estado Islâmico atacou Kobane?

  1. Responder Chauke Stephan Filho out 17,2014 19:54

    Atenção, gente: deve-se escrever “Porque o Estado Islâmico atacou Kobane?” ou “Por que o Estado Islâmico atacou Kobane?”? Qualquer vestibulando sabe a resposta, mas não os autores da versão portuguesa desse interessante artigo. Sugiro aos tradutores da Vila Vudu que contratem um revisor de textos. O Oriente Mídia tem ótimo conteúdo, mas os erros de português causam muito má impressão. A língua portuguesa merece mais consideração e melhor tratamento.

  2. Responder Acosta out 22,2014 15:28

    o EI atacou Kobane (cidade Siria com maioria Curda) para se vingar das derrotas sofridas dos “Curdos no Iraque”.
    Mas, certamente Kobane não vai cair nas mãos do EI, reforços virão dos “Curdos do Iraque”, se não caiu até agora sem ajuda externa, quando os reforços por terra que estão próximos chegarem, o EI vai ser derrotado.

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