França e Israel lançam uma nova guerra no Iraque e na Síria 1

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Thierry Meyssan

Com uma mão, o governo francês mobiliza todos os seus média para focar a atenção da sua população sobre os atentados de 13 de novembro. Com a outra, ele lança com Israel uma nova guerra no Iraque e na Síria. O seu objectivo não é, mais, o de derrubar o regime laico sírio, nem o destruir o seu exército, mas, agora, o de criar um Estado colonial a cavalo sobre o Iraque e a Síria, gerido pelos Curdos, afim de prender em tenaz os Estado árabes. O sonho de uma potência israelita do Nilo ao Eufrates está de volta.

| ESCÓPIA (MACEDÓNIA)


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Neste mapa, publicado por Robin Wright no New York Times, em 2013, distingue-se o Sunnistão que o Daesh criaria, em junho de 2014, e onde ele proclamaria o Califado, e, o Curdistão que a França e Israel querem agora criar. Deve notar-se que este mapa não prevê nada para os cristãos, os quais deveriam ser, ou transferidos para a Europa, ou exterminados.

No G20, Moscou e Washington impõem corte de financiamento do Daesh

A cimeira do G20, em Antalya (Turquia), preocupou-se é certo com a economia, mas, sobretudo, com a situação no Próximo-Oriente. No decurso da cimeira tiveram lugar numerosas negociações bilaterais, e, nós ignoramos os detalhes do que foi discutido e concluído durante estas conversas particulares.

Entretanto, o presidente russo Vladimir Putin denunciou, sem os nomear, os Estados participantes na conferência que patrocinam o Daesh. Ele mostrou aos seus colegas fotografias de satélite de comboios de camihões-cisterna atravessando a Turquia para vender o petróleo roubado pela organização terrorista no Iraque e na Síria [1]. Publicamente posto em causa o seu financiamento do Daesh (E.I.), o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan acusou o golpe, pelas suas violações das resoluções do Conselho de Segurança. De acordo com o Partido Socialista turco, Bilal Erdoğan (o filho do presidente) dirige pessoalmente este tráfego [2].

Os presidentes Putin e Obama puseram-se de acordo para destruir os caminhões-cisterna da família Erdoğan e pôr assim um fim ao tráfico petrolífero. No próprio dia, o U.S. CentralCommand bombardeava, pela primeira vez desde há um ano e meio, os caminhões-cisterna no Iraque, enquanto o exército russo destruía uma enorme quantidade deles na Síria [3].

A Rússia e os Estados Unidos forçaram a França a juntar-se a esta operação. Fingindo reagir aos atentados de Paris, o presidente Hollande anunciou, sem corar, que dava ordens aos seus exércitos para bombardear o Daesh na Síria, enquanto o presidente Putin dava, publicamente, instruções aos exércitos russos para se coordenarem com a França e para a tratar «como» um aliado [4]. O presidente francês irá, dentro em breve, reunir-se com os seus homólogos norte-americano e russo.

Parece que foram tomadas disposições efetivas para isolar os 24 estabelecimentos bancários que o Daesh utiliza a partir do Iraque para transferir o dinheiro; disposições que o Sub-secretário de Estado dos E.U., David S. Cohen tentava, em vão, impôr desde há meses [5].

A França e os «falcões liberais» organizam uma nova guerra

Apercebendo-se que deveria retirar o Daesh da Síria, o grupo de Estados, de multinacionais e de personalidades dos EU que organizam a guerra decidiram, então, lançar uma terceira.

- A «Primavera Árabe» (fevereiro de 2011 a janeiro de 2013) fora lançada pelo Departamento de Estado dos EUA. Tratava-se de derrubar os regimes árabes seculares, quer fossem aliados ou resistentes aos EUA, e de substituí-los por ditaduras dos Irmãos Muçulmanos. Depois de terem derrubado os presidentes tunisino e egípcio durante as «revoluções» de Jasmin e de Lótus, foi declarada guerra à Líbia e à Síria (tal como previsto pelo Tratado de Lancaster House, de novembro de 2010), mas as potências coloniais não chegaram a atacar a Argélia (tomada de reféns de In Amenas)
- A Segunda guerra da Síria (julho 2012 a outubro de 2015) fora lançado pela França, os «falcões liberais» dos E.U. (Hillary Clinton, Jeffrey Feltman, David Petraeus, etc.) e Israel, financiada por um grupo de Estados (Turquia, Catar, Arábia Saudita, etc.) e multinacionais (Exxon-Mobil, KKR, Academi, etc.). Já não se tratava tanto de mudar o regime, mas, sim, de «fazer sangrar» o país e de destruir o seu exército (mais de 100. 000 soldados sírios já morreram lutando contra o terrorismo). Ela chegou ao fim com a intervenção militar da Rússia.
- A Terceira guerra da Síria (desde 20 de novembro de 2015) está a ser desencadeada por alguns membros do mesmo grupo, desta vez tendo em vista criar um novo Estado no Norte da Síria e do Iraque, de maneira a colocar entre tenazes os Estados Árabes que resistem a Israel [6].

Tendo os organizadores da guerra tomado consciência que não lhes será mais possível continuar a agir contra a Síria acordaram em retomar e continuar o programa que levou à criação do Sudão do Sul, em 2012. Este projeto corresponde ao plano de Alain Juppé (Março de 2011) e ao que foi publicado por Robin Wright (Setembro de 2013), o qual previa que, depois de terem apoiado o Daesh para criar um Sunnistão, conviria criar um Curdistão [7].

Não se trata, mais, nem de uma guerra pretensamente ideológica (Primavera Árabe), nem pretensamente religiosa (Segunda Guerra da Síria), mas, sim, pretensamente étnica.

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As operações secretas no terreno

Para fazer isso, eles conseguiram desviar o partido curdo sírio marxista-leninista YPG (agora chamado de «Forças democráticas da Síria») e aliá-lo ao clã Barzani do Iraque. É certo que os dois grupos são curdos, mas, não falam a mesma língua, mataram-se entre si durante a Guerra Fria, e reclamam-se de ideologias diametralmente opostas [8].

De passagem, lembremos que, no momento, o Governo Regional Curdo do Iraque é uma ditadura. O seu presidente Massoud Barzani, um agente da Mossad, colocado no poder pelo Reino Unido e pelos Estados Unidos, se agarra ao poder desde o fim do seu mandato, em junho de 2013 [9].

Eles pressionaram as «Forças democráticas» (sic) a “curdizar” à força as populações não-Curdas do Norte da Síria (Outubro de 2015), provocando o levantamento de árabes e de cristãos assírios, e a ira de Damasco, mas nenhuma indignação internacional [10]. Também não houve nenhuma reação, a propósito, aquando da captura dos campos petrolíferos de Kirkuk pelo Governo regional Curdo do Iraque (Verão de 2014), com os olhos da opinião pública internacional só virados para a limpeza étnica praticada pelo Daesh. À época, não só as grandes potências não haviam condenado a guerra de conquista do Governo regional Curdo do Iraque, mas tinham, inclusive, proposto fornecer-lhe diretamente armas, sem passar pelo governo central de Bagdad, para pretensamente lutar contra o Daesh.

As partes envolvidas no conflito não confessaram fazer a guerra para criar um Estado colonial de Israel e envolver os Estados árabes resistentes numa tenaz, mas, desde que seja necessário declararão lutar por um Curdistão independente; uma posição grotesca uma vez que o território em causa jamais pertenceu ao Curdistão histórico e que os Curdos são aí largamente minoritários (menos de 30% da população).

A 5 de novembro, a França anunciou o envio do porta-aviões Charles de Gaulle para a zona, alegadamente para lutar contra o Daesh, na realidade para tomar posição tendo em vista a Terceira guerra da Síria [11]. A nave deixou Toulon, o seu porto âncora, a 18 de novembro.

De 13 a 15 de novembro, o Governo regional do Curdistão Iraquiano, apoiado pelas «Forças Democráticas da Síria» expulsaram o Daesh do Monte Sinjar (Iraque). Na verdade, os soldados do Daesh tinham-se retirado deixando apenas 300 homens face a uma coligação de várias dezenas de milhares de soldados. A zona libertada não foi restituída ao governo iraquiano, mas, sim, anexada pelo Governo regional Curdo do Iraque.

Muito embora finja não apoiar esta operação, e condená-la, a Turquia aprovou-a quando do Tratado secreto Juppé-Davoutoglu de 2011. Se o pseudo-Curdistão fosse criado, ela não deixaria de para lá expulsar os militantes do PKK

A resolução 2249 autoriza de facto a nova guerra

A 20 de novembro, a Rússia tentou fazer aprovar, novamente, o projeto de resolução que tinha redigido para a sessão de 30 de setembro, e que ela tinha sido forçada a retirar [12]. Ela modificou o seu texto, quando muito aí incluindo referências aos atentados no Sinai, em Beirute e em Paris, e também mencionando nele o artigo 51 da Carta (direito à legítima defesa). Uma segunda vez ela teve que desistir da sua redação, e deixar passar uma proposta francesa legalizando toda a intervenção militar contra o Daesh na Síria e no Iraque, o que o Conselho aprovou por unanimidade (Resolução 2249) [13]. Muito embora possa ser interpretada de várias maneiras, a resolução escamoteia de fato a soberania nacional do Iraque e da Síria. Ela autoriza as grandes potências a imiscuir-se lá, desde que elas pretendam estar lutando contra o Daesh [14]. Trata-se, evidentemente, de libertar o Norte da Síria do Daesh, não para o restituir à Síria, mas, sim, para lá proclamar um Estado independente sob autoridade curda.

A Rússia não se opôs a esta resolução e votou-a. Parece que ela deseja, de momento, aproveitar o plano franco-israelita para empurrar o Daesh para fora da Síria sem, no entanto, aceitar o princípio de um pseudo-Curdistão. A criação de um tal Estado não goza de nenhuma legitimidade no Direito internacional (os Curdos da Síria não são oprimidos, gozam, aliás, dos mesmos direitos que os outros cidadãos). Isto reabre a questão dos direitos das minorias já colocado pela criação do Kosovo, pela Otan. Ela encoraja de fato qualquer grupo étnico, qualquer que seja a sua situação política, a reivindicar um Estado independente, o que implica, por consequência, a dissolução da maior parte dos Estados do mundo –-aí incluída a França— e o triunfo da «globalização».

A reter :
- O Kremlin e a Casa-Branca puseram-se de acordo para cortar os financiamentos do Daesh. Eles bombardearam no Iraque e na Síria os camiões-cisternas da sociedade de Bilal Erdoğan e isolaram os bancos do Daesh.
- Após a captura dos campos petrolíferos de Kirkouk. em junho de 2014, Israel e a França conseguiram prosseguir com a extensão do território do Governo regional curdo do Iraque (captura dos Montes Sinjar), e, em lançar a conquista de território não-Curdo do Norte da Síria pelo YPG, agora nomeado de «Forças democráticas da Síria». Pensam, a prazo, realizar a fusão das duas entidades e proclamar a independência de um Estado pretensamente Curdo.
- A criação de um pseudo-Curdistão, em territórios não-Curdos, não tem qualquer suporte legal no Direito internacional. Ela visa unicamente, junto com a  do Sudão do Sul, prender em tenaz os principais Estados árabes (Egipto, Síria e Iraque) para concretizar o sonho de uma potência israelita do Nilo ao Eufrates.

Tradução Alva
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Um comentário sobre “França e Israel lançam uma nova guerra no Iraque e na Síria

  1. Responder Carlos Cezar nov 27,2015 11:01

    Laico e Islã não podem coexistir.

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