Só quatro dos executados eram xiitas. Um desses era o conhecido pregador e agitador xiita Nimr Baqr al-Nimr, da maioria xiita da província oriental de Qatif, na Arábia Saudita.
Al-Nimr havia convocado a juventude na Arábia Saudita e no Bahrain a levantar-se contra o governo. Pregou a derrubada não apenas dos governos tiranos de Arábia Saudita e Bahrain, mas também, do governo do presidente Assad na Síria. Não era submisso ao Irã, mas defendia a modalidade iraniana de governo. Al-Nimr se dizia contra a violência, mas várias das manifestações convocadas por ele terminaram com manifestantes e policiais mortos. Quase inacreditável que os sauditas o tivessem deixado livre para pregar por tanto tempo. Qualquer clérigo sunita na Arábia Saudita teria sido preso e morto por conversa muito menos revolucionária que a dele.
Alguns idiotas, como Keneth Roth do ‘Observatório de Direitos Humanos’, disse que al-Nimr desejava um estado democrático:
Kenneth Roth @KenRoth
O crime de Sheikh Nimr: liderar protestos pacíficos a favor da democracia saudita, igualdade para os xiitas
Perfeita imbecilidade. Em 2008, um diplomata dos EUA falou com al-Nimr. Telegrama que se pode ler em Wikileaks resume aquela conversa:
Al-Nimr descreve sua atitude e de al-Mudarrasi em relação à governança islamista como algo entre “wilayet al-faqih,” quando um país é liderado por um único líder religioso, e “shura al-fuqaha,” quando um conselho de líderes religiosos deve guiar o Estado. Al-Nimr, que dirigiu estudos religiosos por aproximadamente dez anos em Teerã, e por “uns poucos anos” na Síria, disse que toda e qualquer governança deve ser conduzida mediante consultas, mas a quantidade de poder oficial a ser entregue a uma determinada autoridade governante deve ser determinada a partir da qualidade relativa dos líderes religiosos e da situação política no momento.
Sistema liderado exclusivamente por clérigos ou líderes religiosos não é democracia. Dessa entrevista se pode extrair também que al-Nimr não tinha, na verdade, ideia clara sobre o que realmente queria. O que parecia estar resolvido é que queria “estar sempre com o povo, nunca com o governo”, independente de quem governasse ou do que estivesse certo ou errado.
A paciência dos sauditas esgotou-se quando, em junho de 2012, al-Nimr desrespeitou a morte do ex-ministro do Interior e príncipe coroado Nayef bin Abdul-Aziz Al Saud:
Disse que “o povo deve regozijar-se com a morte [de Nayef]” e que “será comido por vermes e sofrerá no túmulo os tormentos do Inferno”
Foi demais. Al-Nimr foi preso e condenado à morte.
Houve preocupação em torno da possibilidade de a execução de al-Nimr aumentar as tensões entre sunitas e xiitas. Vários governos e a ONU alertaram que a execução faria aumentar as disputas sectárias.
Pois então? Aí é que está!
A legitimidade do governo saudita depende de abundância de dinheiro e de aparecer como wabbabista sectário “guardião da fé”. Elevar a barra da guerra sectária, provocando reação violenta dos sauditas, só ajuda o governo dos sauditas a mobilizar a favor deles até mesmo os clérigos e a população sunita wahhabista. A execução de xiita conhecido também serviu para encobrir a execução dos militantes da al-Qaeda, que também contam com muitos simpatizantes na Arábia Saudita; matá-los sem matar al-Nimr teria levado a protestos, ou coisa pior, dos sunitas radicais. Mesmo com a ‘cobertura’ da execução de al-Nimr, entidades tipo al-Qaeda fora da Arábia Saudita já juraram vingança.
O governo iraniano e organizações xiitas no Iraque caíram rapidamente na armadilha e protestaram contra a execução de al-Nimr. Os iranianos permitiram que gangues organizadas atacassem a embaixada saudita em Teerã, que foi incendiada. Na província leste da Arábia Saudita, manifestantes xiitas atacaram violentamente forças policiais (vid).
Exata e precisamente o que os governantes sauditas queriam e tudo de que mais precisavam. Também pode ter sido o que alguns círculos conservadores iranianos esperavam ansiosamente.
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Comentário n. 1: Harry |3/1/2016 2:51:29 AM |
Meu detector de sarcasmo quebrou, ou alguém aí está abraçando o sectarismo saudita?
Verdade é que foi movimento super estúpido. No curto prazo, sim, é possível que sunitas e radicais passem a defender os sauditas. No longo prazo – o Irã pode fornecer quantidades significativas de armas a Houthis e xiitas oprimidos, os quais, adequadamente comandados e armados podem tomar os campos de petróleo, todos eles. Genocídio tampouco funcionará, porque os xiitas estão armados até os dentes; nem os sauditas terão material humano para combater múltiplas guerras. Diabos, eles não têm mercenários suficientes nem para combater os Houthis.
O Irã tem memória longa. Duvido muito que se ponham a inventar ‘primaveras árabes’ xiitas para escalar a guerra, agora; mas no longo prazo, sim, ferirão fundo os sauditas. A questão é – por quais meios.
Comentário n. 4: jfl | 3/1/2016 3:52:40 AM
Desculpe, mas não há nada de bom em executar a oposição política. Parece que todos querem ser Baracks Obamas (BOs), a incinerar festas de casamentos e funerais, agora já matando os filhos de pessoas que os mesmos BOs também mataram, ou reis sauditas degolando muçulmanos xiitas.
Faço votos que a oposição xiita pegue fogo e que derrube toda a dinastia.
Comentário n. 7: somebody | 3/1/2016, 6:45:27 AM
Tem cheiro de desespero saudita.
A parte mais interessante nem é tanto Nimr, que executaram como contrapeso, mas os “tipos associados à al-Qaeda”, que parece ser do pessoal que voltou do Afeganistão.
Com Síria, Iraque e Iêmen atacando pesadamente os ‘agentes’ de EUA-sauditas em vários fronts, grandes levas de combatentes muito experientes logo estarão retornando à Arábia Saudita para – digamos – procurar serviço.*****
Pelo visto, logo os colaboracionistas sauditas serão derrubados e enfim, com a queda de um aliado yankee, o Estado Sionista (não o Israelita) ficará sozinho…